" (...) os madeirenses não folgam só com os arraiais complementares das festas religiosas, aproveitam ainda outras diversões inteiramente profanas com que, algumas vezes no ano, se libertam de trabalhos e canseiras para dissipar o tempo em proveito do corpo e do espírito. O meio natural e agreste é o mais convidativo àqueles lazeres. E uma das mais típicas diversões, arraigadas na tradição do povo, é a folgança da tosquia do gado lanígero que todo o não chocalha nos montados e baldios da Madeira, criando cebo e lã. Aprazados os dias de Junho mais convenientes à arrumação do gado nos terreiros ou redis de diferentes montados na ilha, para lá se encaminha uma multidão de criadores, curiosos e foliões como para em espera de touros ribatejanos. Amanhece-se na terra à primeira claridade do lusco-fusco para ver chegar o gado em ondulações de rebanhos, congregado e conduzido por pastores e cães, uns aos gritos e outros aos latidos em defesa dos tresmalhos e a estrugar os animais com longos varapaus. Na esteira da sua caminhada elevam-se no ar nuvens de pó que denunciam ao longe a perseguição ao gado e sacode de entusiasmo a multidão espectante. Ao entrar no campo de concentração a coluna perseguida, espantadiça e desmoralizada, cresce o entusiasmo de pastores e forasteiros, e com o descamizar das ovelhas começa a animação em todo o campo. Enquanto se lida na tosquia do gado, desenvolve-se um verdadeiro arraial, dos mais típicos da região". [1] 
 
[1]
PEREIRA, Eduardo C. N., Ilhas de Zargo, 1940, pp.492-493.